GLOBO PERDE PARTICIPAÇÃO EM VERBA OFICIAL DE PUBLICIDADE SOB BOLSONARO.
FÁBIO
FABRINI (FOLHAPRESS)BRASÍLIA, DF
Relatório do TCU (Tribunal de Contas
da União) obtido pela Folha de S.Paulo aponta que o governo Jair Bolsonaro
(PSL) mudou a lógica de distribuição de verbas publicitárias para TVs abertas
ao destinar os maiores percentuais de recursos para Record e SBT -emissoras
consideradas aliadas ao Planalto, mas que não são líderes de audiência.
Embora seja a mais assistida do país,
a Globo tem agora participação no bolo bem menor que a das duas concorrentes, o
que não se verificava no passado, segundo o tribunal.
Desde a campanha eleitoral, a Globo
tem sido alvo de recorrentes ataques do presidente, que reclama da cobertura de
seus programas jornalísticos. No fim de outubro, por exemplo, após reportagem
que vinculou seu nome ao caso do assassinato da vereadora Marielle Franco, ele
pôs em dúvida a renovação da concessão da TV em 2022.
O TCU requereu à Secom (Secretaria de
Comunicação Social da Presidência) as planilhas de valores pagos, via agências
de publicidade, para as três TVs, e compilou os dados.
O objetivo foi subsidiar processo
aberto a partir de representação do Ministério Público de Contas para analisar
se recursos estão sendo distribuídos com critérios políticos, favorecendo
Record e SBT.
Os dados indicaram uma inversão de
tendência. Até o ano passado, a Globo recebia valores mais próximos do seu
share, ou seja, da participação em audiência no total de emissoras ligadas.
Em 2017, ficou com 48,5% dos recursos
e, em 2018, 39,1%. Neste ano, com base em dados parciais, a fatia despencou
para 16,3%. Os percentuais da Record foram de 26,6% em 2017, 31,1% em 2018 e,
agora, 42,6%; os do SBT, 24,8%, 29,6% e 41%, respectivamente.
No relatório, concluído em 31 de
outubro, os técnicos do TCU dizem ser necessário aferir se a “mudança de
comportamento” do governo esteve amparada em critérios “objetivos e
isonômicos”.
A publicidade no governo federal é
disciplinada por uma instrução normativa do ano passado, que prevê a audiência
como um critério para a compra de mídia, mas não o único. Também são levadas em
conta outras características das emissoras, como o seu perfil e alcance no
país, além dos segmentos da população que atingem.
Normalmente, as agências se baseiam em
dados da Kantar Ibope para definir o rateio. Segundo dados do instituto, entre
janeiro e outubro deste ano a Globo tem 33,1% do público da TV, contra 14,5% do
SBT e 13,1% da Record. Os dados se referem às 15 principais regiões
metropolitanas.
Em oito campanhas dos dois últimos
anos, a Globo sempre teve participação majoritária, com share entre 37% e 57%.
Já as duas concorrentes variaram entre 10% e 24%.
Na corrida presidencial em 2018, o
bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus e dono da Record,
manifestou apoio a Bolsonaro, o que se seguiu de outros afagos após a posse.
Em setembro, o presidente visitou o
Templo de Salomão, sede da Universal em São Paulo, foi elogiado e abençoado por
Macedo. Dias depois, recebeu o bispo e o empresário Silvio Santos, dono do SBT,
no palanque da parada de Sete de Setembro em Brasília.
Bolsonaro e seus filhos têm
priorizado as duas TVs em aparições e viraram convidados rotineiros em seus
programas mais populares.
Neste ano, segundo os dados obtidos pelo TCU e atualizados até junho, o governo destinou R$ 16,1 milhões às três TVs. O grosso desses recursos (R$ 15,3 milhões) refere-se à campanha sobre a reforma da Previdência.
Neste ano, segundo os dados obtidos pelo TCU e atualizados até junho, o governo destinou R$ 16,1 milhões às três TVs. O grosso desses recursos (R$ 15,3 milhões) refere-se à campanha sobre a reforma da Previdência.
O plano de mídia, documento que
traçou as estratégias da ação publicitária, diz que a distribuição se deu
“conforme o share de audiência e respeitou as negociações para que a campanha
possa ser vista de forma mais ampla”.
A Globo teve 18,1% da verba da
campanha, a Record ficou com 44,5% e o SBT, com 37,4%.
Os dados de referência do Ibope,
segundo o TCU, mostravam que Record e SBT detinham, cada uma, cerca de um
quinto da audiência das TVs abertas naquele momento.
Houve também ações de merchandising,
e a Globo ficou de fora. Foram contemplados programas para os quais Bolsonaro
dá entrevistas recorrentes, defendendo medidas de sua gestão, como os dos
apresentadores Ratinho (SBT) e Datena (Band).
A reportagem levantou no site da
Secom os pagamentos para os três grupos televisivos, referentes às mais
diversas campanhas, entre 1º de janeiro e esta segunda-feira (11). A mesma
tendência se mantém.
A Globo havia sido contemplada com R$
10,5 milhões, o SBT com R$ 16,3 milhões e a Record com R$ 19,7 milhões.
Com base nas constatações, os auditores do TCU querem que, em 15 dias, a Secom apresente critérios “técnicos e objetivos” que justifiquem a distribuição de anúncios da Previdência. Também reclamam as razões de escolha dos programas para merchandising.
Com base nas constatações, os auditores do TCU querem que, em 15 dias, a Secom apresente critérios “técnicos e objetivos” que justifiquem a distribuição de anúncios da Previdência. Também reclamam as razões de escolha dos programas para merchandising.
A decisão sobre essas providências
será tomada pelo relator do processo no TCU, ministro Vital do Rêgo.
Em 2019, as despesas da Secom com fornecedores em publicidade, em diversos meios de comunicação, totalizavam R$ 140,7 milhões até 11 de novembro. Nos dez anos anteriores, em valores atualizados pela inflação, esse patamar variou entre R$ 156,4 milhões e R$ 280,9 milhões, considerandos os 12 meses de cada ano.
Em 2019, as despesas da Secom com fornecedores em publicidade, em diversos meios de comunicação, totalizavam R$ 140,7 milhões até 11 de novembro. Nos dez anos anteriores, em valores atualizados pela inflação, esse patamar variou entre R$ 156,4 milhões e R$ 280,9 milhões, considerandos os 12 meses de cada ano.
Após se eleger, em 2018, Bolsonaro
disse que os gastos com propaganda estatal cairiam ainda mais em 2020.
OUTRO LADO
Procurada pela reportagem, a Secom
informou, em nota, que os critérios de seleção de veículos nas ações
publicitárias “dependem dos objetivos de campanha e não necessariamente são
representados pelos índices de participação de audiência, visto se tratar de
informação modulada a partir do público-alvo a ser impactado com a publicidade
e da cobertura geográfica”.
Além dos índices de audiência, segundo a Secom, são observadas variáveis como “afinidade, perfil e segmentação de público e relação custo-benefício, entre outros”.
Além dos índices de audiência, segundo a Secom, são observadas variáveis como “afinidade, perfil e segmentação de público e relação custo-benefício, entre outros”.
Questionada sobre qual é o interesse
público em destinar mais recursos a TVs menos vistas, o órgão afirmou que se
vale de “um mix de meios de comunicação, além do princípio da economicidade
previsto na Constituição Federal”.
“Não é uma realidade a presunção de que utilizar o veículo de maior audiência é a melhor forma de investimento de comunicação”, informa a nota do órgão.
“Não é uma realidade a presunção de que utilizar o veículo de maior audiência é a melhor forma de investimento de comunicação”, informa a nota do órgão.
A Secom negou ter havido orientação
do presidente Jair Bolsonaro para mudar o rateio das verbas para as TVs
abertas.
Acrescentou que os valores pagos a
uma emissora “são advindos de programações de mídia com objetivos de veiculação
de conteúdos publicitários das campanhas de divulgação da Presidência”.
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