FIM DA REELEIÇÃO PARA RENOVAR DEMOCRACIA; DIZ CIENTISTA POLÍTICO.

Proposta amplia mandatos para 5 anos e pode impactar eleições municipais já em 2028; especialista analisa efeitos políticos e democráticos da medida.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 12/2022), que prevê o fim das reeleições para o Poder Executivo, está em pauta no Senado Federal. Os parlamentares discutem a não continuidade de mandatos por uma única pessoa nos cargos de prefeitos, governadores e presidentes.
Jefferson Rudy/ Agência Senado  -  Congresso Nacional em Brasília

Na proposta, os parlamentares preveem um aumento dos mandatos para cinco anos, exceto para o Senado, já que a proposta é de 10 anos. Mas essa medida do tempo de mandatos para senadores pode ser revista, já que a senadora Eliziane Gama pediu vista no projeto para fazer uma proposta de diminuição do tempo de mandato dos parlamentares, bem como aumentar o tempo de gestão do Poder Executivo. A PEC, que é discutida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), tem relatoria do senador Marcelo Castro (MDB).

Para entender essa proposta, que pode ter início para os cargos de prefeitos já em 2028, conversamos com o professor associado da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Vitor Sandes.
Arquivo PessoalCientista político, Vitor Sandes.

Segundo Sandes, quando a reeleição nos cargos majoritários iniciou no Brasil, em 1998, a ação gerou uma mudança interessante, que foi o alto nível de continuidade de grupos políticos. No contexto da redemocratização, vários partidos surgiram, fazendo com que, em 1998, a maior parte dos governadores fosse reeleita.

“Aqueles que estão em mandato têm um potencial de reeleição muito maior do que daqueles que estão desafiando. A reeleição permite isso. Você está no mandato, você conseguiu construir sua imagem. De alguma maneira, por mais que existam limitações legais para o uso da máquina, é difícil dissociar a pessoa da própria máquina. Por exemplo, o candidato a governador também é o governador que é candidato. Isso faz muita diferença na força da candidatura e na busca pelo voto.”

Com o fim da reeleição, para Sandes, o maior impacto seria a rearticulação dos partidos para tentar buscar candidatos mais viáveis eleitoralmente. Mesmo sem a continuidade de um mesmo nome, aqueles que são herdeiros acabam tendo mais chances que os desafiantes, desde que o governo seja bem avaliado.

“O eleitor terá que conhecer esse outro candidato da situação. Às vezes pode ser conhecido, mas não tão bem conhecido quanto o outro. Então o eleitor tem um custo maior aí — um custo de conhecer o candidato. Isso a gente não fala de custo monetário, é o custo de se obter as informações, de tempo de se informar.”

Para Sandes, isso aumenta a possibilidade de rotatividade de lideranças, dando margem à construção de novos nomes dentro de um mesmo projeto político, já que não existirá mais a continuidade em volta de um único nome.

“Quanto maior a possibilidade de competitividade, no sentido de você ter outros nomes, ter novos atores políticos, em tese, melhor para a democracia. Com isso, se possibilita que outros atores políticos possam também competir. Então, você dá mais opções para os eleitores. Você tem outros nomes e também gera a possibilidade de que determinados grupos não se encastelem no poder ou não se oligarquizem, que seria um dos entraves para a democracia.”

Sandes relembra que, em 1997, quando foi discutida a reeleição, houve muita resistência da população, já que a aprovação visava atender interesses conjunturais, pois a eleição seria no ano seguinte, com o objetivo claro de atender quem estava no mandato.

Para ele, os questionamentos sobre os ganhos do fim da reeleição passam pelos benefícios reais à população, especialmente no combate aos processos de oligarquização e encastelamento de grupos políticos no poder. Isso reforça a percepção popular de que o poder serve aos grupos políticos, e não sinceramente ao povo.

“Então há uma crítica mesmo, uma visão crítica. E claro, isso acaba impactando na própria confiança da população nas instituições democráticas. Há uma demanda e uma visão da população, ainda que seja difícil dizer que a população discute isso no seu cotidiano. Não é um tema que está na mesa de debate da população, mas claro que isso pode gerar alguma sinalização.”

Sandes cita a proposta de ampliação dos mandatos para cinco anos, sem reeleição, como uma forma de evitar a descontinuidade das políticas públicas. Ele argumenta que, em quatro anos, o primeiro é pautado pelas diretrizes do Plano Plurianual (PPA) da gestão anterior.

“Você tem o segundo e o terceiro ano, em que consegue fazer o PPA. No primeiro ano, consegue começar a aprovar sua agenda de governo. Quando você chega no quarto ano, que é o último, você tem uma série de restrições para o gasto e inclusive mudanças no seu gabinete, na composição dos cargos estratégicos, porque diversos nomes acabam se colocando ali como candidatos.”

Para Sandes, os cinco anos seriam uma tentativa de possibilitar que os governos consigam implementar duas agendas — aquelas aprovadas para a sua eleição.

“O eleitor foi lá, se decidiu por um determinado candidato e votou. E esse é um desafio muito grande, porque às vezes o governo acaba frustrando também a vontade do eleitor porque o governo não teve as condições, às vezes até mesmo orçamentárias, para garantir a implementação daquela agenda. Então realmente o debate tem que ser feito, porque tem uma questão normativa sobre se é aceitável moralmente, enfim, a extensão de mandato de 4 para 5 anos. A rotatividade não necessariamente é eficiente do ponto de vista administrativo, porque senão, se a gente utilizasse a rotatividade por si só como pressuposto da boa qualidade de democracia, a gente poderia reduzir isso, por exemplo, a cada ano.”

O DIA. CPOPM - TERESINA

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