SEM AÇÃO, EM DUAS SEMANAS BRASIL VIVERÁ CENÁRIO DE GUERRA, DIZEM ESPECIALISTAS.
Vamos ter pessoas morrendo em casa ou morrendo na porta dos
hospitais, porque não vamos ter onde interná-las. Vamos ter um cenário de
guerra”, avalia Thaís Guimarães, médica infectologista e presidente da Comissão
de Infectologia do Hospital das Clínicas.
A análise ocorre no momento de maior recrudescimento da
segunda onda da pandemia do novo coronavírus no país, em meio ao temor de um
colapso no sistema público de saúde. O
Brasil registrou na quinta-feira (25) o segundo maior número diário de mortes
desde o início da pandemia, ao todo foram 1.541 óbitos por Covid-19
contabilizados em um período de 24h.
Em meio à crise da saúde pública, que ocorre nas cinco
regiões do país, a CNN ouviu especialistas sobre as previsões para as
próximas semanas epidemiológicas.
“O cenário da pandemia para as próximas semanas se revela
dramático. O que foi vivenciado em Manaus é o que devemos ter no resto do país
nas próximas semanas”, diz Raquel Stucchi, professora da Unicamp e consultora
da Sociedade Brasileira de Infectologia.
Segundo a especialista, a alta transmissão da Covid-19 é um
dos principais fatores responsáveis pelo agravamento da pandemia, assim como o
deslocamento da faixa de idade dos pacientes internados para abaixo dos 50 anos
— grupo que tende a aglomerar, em especial os jovens.
Para a professora de epidemiologia Ethel Maciel, da
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), as variantes da Covid-19 em
circulação no país tendem a aumentar o índice de contaminação nas próximas
semanas, principalmente quando combinadas com as aglomerações.
“O que podemos supor é que a P1 (variante identificada em
Manaus) vai se tornar dominante e se espalhar rapidamente”, afirma.
Apesar da circulação acelerada das variantes, a
epidemiologista avalia que os estados não devem colapsar ao mesmo tempo.
“Temos curvas epidêmicas diferentes em cada estado, por causa
da adoção de medidas diferentes. É possível que a gente arraste essa pandemia
no pior nível por mais tempo. Eu acredito que março vai ser muito ruim”, prevê.
“Se o país inteiro chegar ao nível de Manaus, com pessoas
esperando tratamento de UTI, não é nem colapso, é tragédia. Médicos darão
sentença de morte aos pacientes por conta do longo período de tempo esperando
um leito.”
Ethel afirma que a vacinação em massa é a principal medida
que poderia ser adotada para frear o avanço do vírus e suspender a transmissão
das variantes.
“O que poderia mudar esse cenário é uma vacinação rápida, com
mais de 1 milhão de pessoas sendo vacinadas por dia. Estamos colhendo agora a
inação de 2020”, diz.
Efeito carnaval e colapso
A infectologista Raquel Stucchi explica que um colapso na
saúde pública é caracterizado pela demanda de internação superior à capacidade
de tratamento.
“100% de ocupação dos leitos de UTI (Unidade de Tratamento
Intensivo) é o colapso instalado. Mas, acima de 90% já estamos em colapso,
porque não temos como fazer a rotatividade de leitos”, explica Thaís Guimarães.
De acordo com dados revelados pelas secretarias de Saúde, pelo
menos quatro estados brasileiros ultrapassam 90% da taxa de ocupação das UTIs.
A situação é mais crítica em Rondônia, que usa 97,5% de suas
vagas. Depois aparecem Acre (93,3%), Roraima (92%) e Amazonas (91,9%) – os
quatro localizados na região norte.
Apesar dos estados do norte estarem em colapso, diversas
cidades de outras regiões do país vivem a mesma situação, como Araraquara, em
São Paulo, que atingiu
100% da ocupação dos leitos de UTI no último dia 17 de fevereiro.
crise no país ocorre poucas semanas depois do carnaval, cujas
comemorações foram proibidas pelas autoridades em 202. No entanto, diversos
casos de violações das medidas sanitárias foram observados neste período.
“O colapso está relacionado a este evento, mas não é só por
conta do carnaval. Temos o efeito das variantes e das aglomerações que
ocorreram naquele momento. Esses dois elementos tiveram uma combinação
desastrosa. Mas pode ser que outras coisas estejam contribuindo para o
agravamento da crise, e a gente não tem pesquisa para ter certeza”, diz Ethel
Maciel.
Medidas restritivas
Segundo a epidemiologista Ethel Maciel, apenas medidas
rígidas de restrição da circulação podem coibir o colapso.
“Deveríamos fazer lockdown, fechar tudo por 21 dias para
evitar as mortes, mas não é possível neste momento por conta das pressões
sofridas pelas autoridades. Deveríamos ter um plano nacional. O que fizermos
agora vai refletir daqui 15 dias. A gente precisa de um pacto social para
salvar vidas”, diz a professora.
Segundo
levantamento da CNN, há oito estados em que há algum tipo de toque de
recolher está em vigor: Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Mato Grosso, Paraíba,
Paraná, Piauí e São Paulo. Na sexta-feira (26), o governo de SP decretou o
retorno da Região Metropolitana de São Paulo para a fase laranja.
Em São Paulo e no Distrito Federal, os governadores adotaram
medidas de restrição de circulação no período da noite.
Para a infectologista Thaís Guimarães do Hospital das
Clínica, as restrições não são suficientes para evitar o colapso que se
anuncia.
“A medida restritiva das 5h às 23h ou das 20h às 5h não
adianta nada, porque é de manhã que as pessoas estão circulando nas ruas”,
afirma. “Precisamos impedir que as pessoas usem serviços não essenciais, como
restaurantes e bares.”
Apesar da recomendação dos especialistas de que reuniões
sejam evitadas, cidades como o
Rio de Janeiro voltaram às aulas no pior momento da pandemia. Em outros
casos, como na
Bahia e no Rio Grande do Sul, a Justiça vem intervindo na decisão de
governadores de obrigarem o retorno dos jovens às escolas.
“É uma medida acertada não voltar às escolas em um momento de
aceleração do vírus. Se a pandemia está acelerada no município, ela vai estar
acelerada na escola porque ela está inserida nesse contexto”, diz Ethel Maciel.
Fonte: CNN
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