'TRAGÉDIA ENTRARÁ NA CONTA DOS NEGACIONISTAS', DIZ DIRETOR DO BUTANTAN


Diretor do Instituto Butantan diz que, se não fosse governo, Brasil já teria vacina desde dezembro, e aponta obscurantismo científico das autoridades como responsável direto por nova onda explosiva de Covid-19.

Fazia exatamente três anos que o médico hematologista Dimas Tadeu Covas estava à frente do Instituto Butantan quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o mundo vivia uma pandemia: a de covid-19.

Na corrida aberta em busca de uma vacina, ele apostou em um parceria internacional que, meses à frente, se revelou minimamente eficaz: em janeiro de 2021, a campanha de imunização brasileira começou justamente com produto desse acordo, no caso a vacina Coronavac, desenvolvida pela empresa chinesa Sinovac.


Brasil vive no momento a maior média móvel de mortes da pandemia Foto: Bruno Kelly / Reuters

No momento em que o Brasil vive seu pior momento desde o início da pandemia, com mais de 250 mil mortos e hospitais operando no limite de suas capacidades, Covas diz que "a interferência política na saúde pública tem sido uma grande barreira para o combate adequado à epidemia e explica muito a posição do Brasil como vice-campeão mundial em mortes pelo covid-19".

"A negação da gravidade de pandemia, a disseminação de tratamentos sem comprovação científica, o combate deliberado ao uso de máscaras e as medidas de restrição de circulação são os grande responsáveis, nesse momento, pela segunda onda explosiva que o país está sofrendo”, diz ele. "A história colocará essa tragédia na conta desses negacionistas".

O Instituto Butantan é uma entidade pública ligada ao governo estadual paulista. Nos bastidores da crise com o governo federal estão os dividendos políticos de dois protagonistas do cenário político brasileiro: o governador de São Paulo, o tucano João Doria — que desde o princípio busca para si o capital político da vacina do Butantan — e o presidente da República Jair Bolsonaro — que em diversos episódios buscou difamar o imunizante.

O diretor do Butantan, contudo, frisa que à despeito dessa batalha, o instituto paulista "continuará como o principal fornecedor [de vacinas ao Ministério da Saúde] por muito tempo ainda”.

DW Brasil: Há um ano, o Brasil teve o primeiro caso oficialmente registrado de covid-19. Desde essa época, estava aberta uma corrida mundial pelo desenvolvimento de uma vacina contra o coronavírus. Quando o Butantan decidiu procurar um parceiro para a produção de vacinas?

 

Dimas Tadeu Covas: O Instituto Butantan mantém-se alerta para o surgimento de epidemias, inclusive participa de organismos internacionais como o CEPI [Coalizão para Inovações em Preparação para Epidemias] cujo objetivo maior é a preparação para o enfrentamento de epidemias. Com o surgimento da epidemia de covid-19, imediatamente iniciamos o trabalho de prospecção de vacinas e de rotas tecnológicas para a sua produção. Neste caminho, já tínhamos conhecimento prévio da Sinovac, [empresa] que visitamos em 2019 e da qual também recebemos uma visita para discutirmos cooperação em vacinas. Já existindo esse aproximação e considerando que a Sinovac já tinha uma vacina em desenvolvimento em cuja tecnologia [de vírus inativado] temos experiência, nada mais apropriado. A parceria foi firmada preliminarmente em maio e assinada em junho do ano passado. O acordo, amplo, incluía o desenvolvimento de estudo clínico de fase 3 para a vacina no Brasil.

Na época em que foi firmada essa parceria, como o senhor avaliou os riscos — no sentido de a vacina não se demonstrar eficaz ou viável? Houve momentos em que conviveu com dúvidas se daria certo a parceria, se os resultados viriam?

A parceria foi firmada já com o conhecimento dos resultados preliminares das fases pré-clínica e clínica de fase 1 e 2. Os resultados promissores nos animaram para prosseguir para a fase 3, que seria importante para a vacina em termos mundiais. Obviamente, todo estudo científico pode não ter resultados de acordo com o desejado, mas sempre acreditamos e trabalhamos duramente para conseguir realizar o estudo no menor tempo possível e com o maior rigor necessário para demonstrar a utilidade da vacina no combate ao covid-19. Riscos são inerentes a todo processo inovador e o cientista e gestor responsável deve avaliar corretamente e assumir estes riscos, principalmente quando se trata da vida de milhões de pessoas. Assumimos o risco e felizmente hoje temos uma excelente vacina que é a base do programa nacional de imunização nesse momento.

FONTE - ÉPOCA

 

 

 

 


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